nenhuma clareira se estende ao verão.
a cidade avoluma-se de gesso pardo, quase imaterial. gente invisível
corpos andantes, soprando a lentidão difícil da respiração.
aceno-lhes, da anónima transitoriedade da luz que embrulha a tarde.
ninguém nota. um degrau, antigo de séculos, acumula-me.
estou só e é tão grande o peso do céu sobre a casa.
acendo uma palavra pura, uma palavra que seja o respirar de um pensamento
para que a sua ressonância me toque o ombro
ou a minha boca se engravide de milagre.
porém, aresta a aresta , ela esmaga-se contra um silêncio de esquinas pontiagudas.
então, a casa grita e um fio de sangue reduz a flor inicial a um objecto inanimado.
tudo na memória se perfila e é um rio que se move
como um deus triste nos princípios de um sorriso.
- desde quando esta água é substância suicida dos instantes?
nenhum fogo fabuloso, nenhuma harpa no silêncio.
breve, tão breve como a conjugação de um agosto sem aves
eu, nocturna, regresso onde o poema faz sombra.
tela: paulo ossião
19 comentários:
A casa, pelo menos, possui a esteira envolvida em quadros de memória, fios de água com história em busca da confluência...
Belo, muito conseguido!
Abraço
Regressar onde o poema faz sombra para encontrar a clareira de luz onde as aves vão beber o silêncio "antigo de séculos" que transfigura as palavras...
Mais um poema maravilhoso minha querida Maré. Um beijo imenso.
palavras bonitas, ainda que cobertas por uma sombra, que quase as deixa à beira da "chuva"...
beijos Maré
Somos regressos constantes. Sobrevivemos muito para além da nossa força.
Tão belo, Maré.
Beijinhos
Absolutamente belo , passei para ler-te e reler-te ... Que Bom encontro , Maré ...
Um abraço
_______ JRMARTo
luminosas sombras que te habitam!
e se fazem poema.
belíssimo.
beijos
Tão agosto
tão belo
tão breve...
beijo, Maré.
Não fosse verdade e é
os céus terem um peso insuportável
a tua casa seria e é
um pomar luminoso de palavras
água de beber
Bj
nocturna sombra
diurna noite...
um dia a imagem de arcos esbatidos
onde há sombras nocturnas no fundo
virá tornar negros os mundos
delineados por falsos sentidos
ou ôtra merde com sombreados obscyurus ynseguros
magnética
ressonância
[que cruza
o corpo da
casa]
*****
beijo
«-desde quando esta água é substância suicida dos instantes?»
que bom reler-te, Maré! tua poesia da sombra, da solidão, do silêncio, da noite, da perenidade em que morrem os instantes. tua poesia tão bela e encantatória, onde és luz e voz, chama de crepúsculo e melodia de harpa.
beijo grande, Maré.
Lendo "palavras puras" em versos plenos de seiva que me dilatam a alma.
Mais que perfeito.
Parabéns
Sofia
Muito bonito.
Não cohecia o blog.
releio, maravilhada, e interrogo-me se voltarás...
beijinhos.
Lindo este poema. Obrigado por o tere s escrito.
Beijo
Porquê tanto peso na solidão? Talvez a tristeza...
As sombras, também o poema e a casa, claro. E, no poema, esbate-se o silêncio...
um beijo de Boas festas e votos de um Bom Ano Novo 8apesar de tudo...).
saudades de te ler...
Maria manuel
Maré, venho desejar-te um feliz Natal e que o novo ano nos traga mais palavras tuas.
[Se vierem por bem.]
Um enorme beijinho
Espantos em ondas revoltas daqui até mim, em todas as minhas marés...
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