domingo, 31 de janeiro de 2021


                                                                                              Tudo o que me dói são poemas inacabados


voltar a casa

ser raiz e haste à hora do dilúvio

gemer o vento quando a morte me ombreia os passos

e desvirtua as mãos

consentidas de noite e de flagelo.

 

já não viajo

(viajar é sonhar em frente)

resta apenas o vago desejo de itinerários

onde o mundo adormece de silêncio

e me esqueço do choro

da dor lilás dos que escurecem sem esperança.

 

 


e   ainda assim   ser

soleira

pedra

espuma

flor sobrevivente da geada ao meio-dia

 

 

voltar a casa

dobrar o olhar sobre uma carta de amor

um túmulo de aves

 

 

foto: Mikahil Batrak

4 comentários:

Graça Pires disse...

"voltar a casa
ser raiz e haste à hora do dilúvio"
Chegaste de novo, no teu estilo fabuloso. Sabes que qualquer casa, seja ela qual for favorece a intimidade e é o lugar onde se desenrola a nossa vida. Por isso podes ser a soleira, a porta, a janela. Tudo o quiseres, que palavras não te faltam, minha querida Luísa. Que boa surpresa encontrar-te aqui novamente.
Cuida-te bem.
Uma boa semana.
Um beijo enorme.

Luis Eme disse...

Que boa Maré, apesar do dilúvio que nos cerca.

abraço (com aperto)

lupuscanissignatus disse...

Um espanto.

"E ainda assim ser"

Jaime Portela disse...

Isto é poesia de fino quilate.
Que encanta desde o primeiro verso.
Beijo.