terça-feira, 22 de junho de 2010





escrevi as horas todas dentro do corpo.
as mãos, vagarosas, como pretexto de chegadas.
julguei dizer-te que o relógio do tempo lança à cinza
raízes minúsculas de um coração tangente ao mar
mas o golpe de uma asa é uma lâmina
que se lança à pele sem o aviso dos comboios.
cerro os olhos a orientar a confusão
ao dizer o gesto simples que pesa à luminosidade
do amor: as mãos cheias de susto rente à bússola da solidão.
nada se revela a escrever um rosto.
guardei tudo o que possuí.
e tudo é água. e membrana que reveste a costela de um pássaro.



tela. marc chagall

35 comentários:

Maria disse...

'as mãos cheias de susto rente à bússola da solidão'
belo. belo. belo.

beijo, maré.

Luis Eme disse...

claro que se revela... escreves um rosto que se reflete nas águas silenciosas, que se fingem mudas...

bjs Maré

Mar Arável disse...

Quando se ama assim

até as palavras ficam esculpidas

na água
Bj

mariavento disse...

...as mãos cheias de susto rente à bússola da solidão.
Excelente!

pin gente disse...

usa as mãos para que entenda o que falas! nelas trazes escrito o vento e são elas que dão a partida e que anunciam a chegada. se as cobres cegas-me!
o mover sincopado das palavras nos teus lábios para o ponteiro do meu tempo. cada passo meu é como que uma ordem tua. a tua vida segue e é o meu rosto preenche-se das tuas rugas. tu, voas e meus braços nascem penas permeáveis. só as mãos falam a pureza da verdade.


um beijo, maré
luísa

utopia das palavras disse...

Todos os medos, desvarios ou solidões se podem esconder dentro do corpo...a ilusão também!

Sempre belo!

Um beijo

AC disse...

As palavras irrompem, violentas, em busca de sentido. Esboçam-se contornos, que se debatem no sentido da afirmação. Mas ela não chega, deixando apenas resquícios da luta travada. E uma mão cheia de nada.

beijo

Manuel Veiga disse...

muito guarda quem muito vive.

para além da "cinza dos relógios"...

belíssimo. sempre...

beijos

Graça Pires disse...

Ser a paisagem dos disfarces
na voz calada da raiva
enquanto um rio te desagua nos olhos...
Belíssimo poema, miúda. Um grande beijo.

Nilson Barcelli disse...

Um poema repleto de excelentes imagens poéticas.
Beijos.
PS: por vezes também engulo relógios...

Sentado no Fim de uma Âncora disse...

Nas ondulações do imenso azul mar adentro
Das rotas incertas da água
No tão perto longínquo navegar
Prendes o olhar no decifrar do teu amar

Impossível afastar-me do poema, levo a vontade de cá voltar para o ler novamente. Deixo que a leitura me leve a tocar a sua densidade, habitá-lo e sentir a sua força, e assim fico...

Inspirador poema
Inspiradora tela trazendo à luz os rostos e os gestos em soberbo azul
Inspiradoras pétalas que correm na brisa de som

Como navegante perdido no deslumbramento da aura dos teus poemas

Belíssimo blogue.

Anónimo disse...

querida maré. ante-ontem li e saí muda. ontem li e saí calada. hoje, com uma ternura inadiável, quero deixar-te um abraço e votos de um óptimo fim de semana. vou num pássaro que voa (de avião :) e volto noutro. a mesma viagem da outra vez. mas por outro motivo... gostava tanto de falar contigo. temos de encontrar o tempo e o lugar para falar, amiga. a poesia que escreves tem de aparecer em livro. para eu dormir melhor à noite... (só por isso :) beijinhos*

lobices disse...

...e as tuas palavras voam nas asas de um pássaro...

maria josé quintela disse...

o corpo a representar o tempo.


.


um beijo maré.

Virgínia do Carmo disse...

Tudo é água, cristalina e depuradora, a esvaziar a angústia...

Um terno abraço, Maré

(Grata pelo teu dom...)

lupuscanissignatus disse...

líquida

memória


[fulge
dentro
do
sólido
corpo]


*solarengo
domingo*

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

M.

já li este poema várias vezes, e fico sem palavras para o comentar.

acho que escreves muito bem e estou a repetir-me, gostei do que li, e destaco a seguinte estrofe que achei sublime:

"o golpe de uma asa é uma lamina"

boa semana!

um beij

Jaime A. disse...

guardei tudo,
tudo é água,
já nada escrevo,
urge encontrar atalhos

© Maria Manuel disse...

com as mãos inscreves o amor.
com as mãos receias a solidão.
depois guardas tudo o que fica

«e tudo é água. e membrana que reveste a costela de um pássaro.»

lindo! linda a tua maneira de dizer do amor e das várias emoções que giram em seu torno, que pode despoletar.

obrigada por mais um poema. beijo grande :)

Anónimo disse...

só para dizer que também gosto do verso em rodapé :) beijinho grande*

A.S. disse...

Maré,

As mãos vagarosas esventram o vento. há uma imensidade deserta,
um sulco no peito, um cisne com asas de sal.
As horas penosas escondem-se com a seda das noites rasgadas onde cresce o frio e um luar selvagem.
tudo é água. os pássaros comem o rio e restituem o silêncio.


Um beijo, querida Poeta!
AL

maria josé quintela disse...

voltei.



para reler o espanto.



beijo maré.

Anónimo disse...

Num corte apenas escrevi o teu nome... Mas como há muito tempo que não olhas para o meu o corpo, não imaginas que tu estejas lá...

O texto é um dos muitos que tenho escrito este ano para a mesma pessoa...

Não quero, por isso, causar celeuma à conta de um "desabafo"...

Gostei, como sempre, da tua escrita.

Nilson Barcelli disse...

Minha amiga, passei para te ler (reler...) e desejar um óptimo fim-de-semana.
Beijos.

Licínia Quitério disse...

Já tudo por aqui foi dito melhor do que eu o direi.
Não é um texto fácil. Tem de ser relido e relido de tão rico que é.
Tudo se pode guardar dentro do corpo. O amor não. É lâmina e logo água.
Um dia te entenderei melhor. Quem sabe? Quanto a gostar, isso é outra coisa. Gosto.

Beijinho e desculpa a minha sinceridade e debilidade.

isabel mendes ferreira disse...

aqui todo o golpe é uma asa.




sempre.



e eu "prendo" cada voo. na árvore da memória.


beijo.

Gabriela Rocha Martins disse...

....e tudo é excepcional mente belo naquilo que escreves ,minha querida

começo a não saber comentar os teus poemas ,de tão belos



.
um beijo ,Luísa

vieira calado disse...

Muito belo, muito bom

este seu poema!

Saudações poéticas

Anónimo disse...

querida maré, estou em lisboa por motivos de trabalho e com o tempo contado para a net, mas hoje tive necessidade de vir aqui, pensei em ti, na tua poesia, quantas vezes disse para mim mesma, vou lá hoje! e agora que cheguei e reli, sinto o meu cansaço tão longe de mim... é uma benção o efeito de te ler... um grande beijinho*

vieira calado disse...

Vim espreitar a ver se havia novidades...

Neste dia de tanto calor

desejo-lhe

a sombra fresca dum árvore!

Beijoca

batista disse...

li, reli... palavras que me tocaram por demais.

só depois de várias passagens por cá, comento. grato.

deixo um abraço fraterno.

Luis Eme disse...

olá.

boa noite.

beijinho

Sentado no Fim de uma Âncora disse...

Nos passos dos dias
Vejo um azul no horizonte do céu
Sombras e os gestos que cruzam
A suave brisa no calor do sol
Cintilantes luzes que despontam à noite
Como navegante
Evito a palavra saudade
Venho abeiras-me “tangente ao mar”
“rente à bússola da solidão”das palavras

henriquedoria disse...

Volto às tuas marés. à tua beleza. À tua verdade. Beijos

Jaime A. disse...

Porquê essa ansiedade, essa angústia? Todo esta poema é lindo, magnífico na expressão de um estar tão dolorido.
Descreves na perfeição
"o ar gelado que te encobre,
o frio tempo,
a escalada húmida
que se esvai por tuas mãos;
hoje engoles o pranto
na certeza de um amanhã liberto."