sexta-feira, 25 de setembro de 2009




tinham-lhe dito que a alma era uma casa com janelas verdes.
ela sentava-se a bordar letras na ternura de equinócios
quando a casa adormecia despida e branca
à espera de um outro lado na geografia da noite.
ao toque das três badaladas
um relâmpago sobre o prado.
ele chegava com as mãos agridoces
cavalo selvagem no dorso da insónia
derrubando quixotescos moinhos com uma espada de prata
e todas as palavras ferviam .
como uma voz que acordava do sono.
a noite transpirava o sumo das estrelas
rebentavam marés na quilha dos barcos.
a noite era uma variação que saía da pele
entre um poema de Rilke e uma nota lancinante de Creep…


que nome dar à noite deste rosto
a esse poema desfeito?
__a gramática é uma memória entre os olhos
quando a chuva chega e se desencontra do fogo.


é tarde na eira de todos os verbos
na bússola que indica o rumor dos ventos sobre o mar.
arruma lentamente as metáforas na rota indecisa dos barcos
com um manso choro de búzios
ou um queixume de sereia prisioneira de fábulas
e deixa à redenção da noite o trajecto precário da luz.



ft: joão p redondo

25 comentários:

Arábica disse...

Uma noite, ela desafiará a quilha dos barcos no ponto lento da agulha. Um dia ela bordará uma outra cor, uma outra ceifa.
Madura.
E sem metáforas.

Gosto sempre muito de te ler, Maré.

Um beijo e bom fim de semana.

Isabel disse...

bom dia mar de Maré...
não sei continuar este teu imaginário. apenas entro e navego. ao sabor de um registo que se deixa prender suavemente.

obrigada.




(abraço.com letras a serem doces no estalo dos relâmpagos).



I.

Anónimo disse...

Ola...
pasei por ca para te fazer uma visita,e posso te dizer que adorei o que li...
Fez-me nevegar,mesmo sem ter barco...
Bjs...
Tem um resto de um bom fim de semana...

Graça Pires disse...

Também deixo à noite o trajecto da tua luz. Não precária. Mas salva pela beleza com que navegas as palavras.
Muito belo este teu poema, minha Amiga, Maré de Espanto.
Um beijo imenso.

Virgínia do Carmo disse...

Muito lindo! Estou certa de que o teu sangue, Maré, tem a cor da poesia...
Bom fim de semana!

lobices disse...

...como sempre: gosto

maria josé quintela disse...

as janelas da alma mudam de cor conforme o ângulo da luz.


(à noite são brancas porque têm luz própria)


e depois existem as marés... para garantir o espanto.


bom dia maré

e um beijo.

quanto pesa o vento? disse...

leio.
releio.
muito bom.
abraço.

antonior disse...

A transcendência do tempo na pedra e no musgo. Nas tuas palavras a da luz...e da alma, no desencontro entre a água do céu e o fogo.

Beijinhos

P.S. - Respondi aos comentários do post “Amarelo – O Pequeno Tigre” na mesma página em que foram feitos

Maresias disse...

São os verbos nas palavras que os monstros
e os anjos se desenham no sonho de qualquer maré.

Deixo-lhe um beijo de luz e um imenso agradecimento por tanto tanto.

Luis Eme disse...

nunca é tarde na eira dos verbos, que nem precisam de ser todos... porque os substantivos também são uma preciosidade...

bjs Maré

lupuscanissignatus disse...

tecelã

de

solstícios



[e de noctívagas

colheitas]


*beijo*

isabel mendes ferreira disse...

b.e.i.j.o.

isabel mendes ferreira disse...

m.a.r.é.

Licínia Quitério disse...

"...a alma era uma casa com janelas verdes". A noite era a casa quando ele chegava e todas as palavras ferviam.
Que belíssimo poema, Maré.

Um beijo.

Nilson Barcelli disse...

"como uma voz que acordava do sono.
a noite transpirava o sumo das estrelas
rebentavam marés na quilha dos barcos.
a noite era uma variação que saía da pele
entre um poema de Rilke e uma nota lancinante de Creep…"
Escreves tão bem... sou um fã incondicional do que escreves.
Querida amiga, gostei imenso do poema.
Beijo.

maré disse...

um beijo Isa

a ser fruto amendoado

vergado silêncio

música do sangue.

Isabel disse...

sim é tarde na eira de todos os verbos!


.somos tão efémeros quanto asas.



beijo de bom dia. a agradecer.



y.

Amita disse...

As palavras cintilam pela noite da "eira de todos os verbos"...

E a casa continuará com janelas verdes abertas sob o templo dos tempos...

Um bjinho grande

Gabriela Rocha Martins disse...

serei ,apenas ,mais um espanto curvado à força desta maré

repito à exaustão - belíssimo



.
um beijo

Cristina Fernandes disse...

Neste espaço encontramos palavras cheias de luz, com um ângulo peculiar... parabéns!
Um abraço
Chris

JOSÉ RIBEIRO MARTO disse...

eu gostaria de faler de uma janela aberta , vermelha e furiosa , da cor do lume e das esperas . Falo da poesia , desse eco profundo que dói lá longe quando estamos perto do milagre e não da repetição , do excesso de manifestação de apreço , no beijo lunático e virtual , do trejeito do plágio também ele virtual á mingua de reputação, mas não posso , porque aqui se escreve poesia , com a chama acesa de quem não tem medo de emoções nem das suas nem dos outros . E isso tem o peso da alma e da minha que é selvagem ... Talvez alguém entenda que não é com fintas que se escreve . Por isso , Alma a tua é livre e não se deixa ofuscar com com um clique traiçoeiro e falsamente humilde ,abundantemente meloso .
abraço
Sou
______ José ribeiro Marto

Isabel disse...

bom dia "trajecto de luz".






beijo.



y.

© Maria Manuel disse...

as marés de uma noite, ou de tantas as noites, sob o «trajecto precário da luz».

admirável o mundo da tua poesia, a tua forma de nomear o mundo... tão belo o poema!

beijo grande, Maré!

Jaime A. disse...

as fábulas escorreram,
os equinócios recolhiam-nas,
adormecidos pela insónia,
a ponte era desunião dos sentidos,
minhas mãos alargavam-se
pelos prados da aurora